Na incansável busca pelo conhecimento, a humanidade, desde tempos imemoriais, procura desvendar os mistérios da existência e, em sua audácia, pretende subverter as barreiras impostas pela natureza. Dois arquétipos literários manifestam com clareza tal anseio: o de Victor Frankenstein, que, em sua pretensão desmedida, ousa criar vida a partir da morte, e o de Pigmalião, cujas mãos moldam uma figura à qual apenas o favor divino concede a vitalidade. Ambos, porém, caminham em direções opostas, revelando os limites e as conseqüências últimas da ciência sem Deus e da arte submetida ao transcendente.
Victor Frankenstein, o cientista da obra de Mary Shelley, é um exemplo emblemático do que poderíamos chamar de "falsa ciência". Ele não se contenta com os limites naturais; deseja sobrepujar a própria morte, inverter as regras da existência, tornar-se criador sem o mínimo vislumbre de reverência pelo mistério da vida. Em sua sede por glória e poder, Frankenstein dá à luz um ser do qual rapidamente se arrepende, sendo perseguido eternamente pela criação que outrora ansiava controlar. Essa criação, resultado do orgulho humano e da falta de humildade diante do desconhecido, é um reflexo direto do desrespeito à ordem divina.
Em Frankenstein, vemo-nos diante da consequência inevitável do cientificismo desenfreado: aquilo que é criado não é verdadeiramente controlável. O monstro que emerge das mãos do cientista não é uma simples criatura viva, mas uma entidade dotada de consciência, um ser que tem seus desejos, suas dores, sua revolta contra seu criador. Frankenstein não busca, com humildade e consciência dos limites impostos por sua própria natureza, elevar-se ao conhecimento sublime do universo; ao contrário, busca tomar para si aquilo que pertence ao próprio Deus: o dom da vida. Ao tentar ser como Deus, ele não apenas fracassa, mas é arrastado ao abismo do desespero, sendo incapaz de guiar ou amar sua criação.
Em nítido contraste, temos a história de Pigmalião, o escultor que molda uma estátua tão bela que passa a amá-la. Pigmalião não se arroga o poder de conceder à sua obra o dom da vida. Ele a venera, reconhecendo nela a expressão de algo superior, e seu desejo profundo é, de certa forma, um apelo aos deuses, uma oração silenciosa para que sua criação seja agraciada pelo toque do divino. Em sua humildade, Pigmalião não pretende ser criador no sentido absoluto; ele sabe que a vida é um dom que não pode ser outorgado por mãos humanas. Assim, quando Afrodite atende ao seu pedido e concede vida à sua obra, este ato é um gesto de graça, algo que transcende o poder humano. A criatura de Pigmalião não o persegue; ao contrário, torna-se sua esposa, um símbolo de harmonia entre a criação e o criador, da submissão da arte e da ciência à ordem superior.
A falsa ciência, aquela que se arroga criadora e pretende negar a necessidade do transcendente, resulta, invariavelmente, em monstros. Como Victor Frankenstein, a humanidade moderna, muitas vezes, quer crer que a vida é um produto de técnicas, de processos manipuláveis, de experimentações laboratoriais que dispensam o olhar reverente à sacralidade do ser. A ciência, quando desprovida de qualquer noção de finalidade transcendente, torna-se um mecanismo vazio, incapaz de gerar verdadeira vida, pois se baseia em premissas errôneas: a crença de que a vida é redutível a meros processos bioquímicos e que a consciência é um epifenômeno sem mistério.
A verdadeira ciência, ao contrário, reconhece seus limites. Assim como Pigmalião, ela é consciente de que a vida não pode ser fabricada; é um dom que pertence a uma ordem superior. O cientista, neste contexto, é aquele que, ao explorar os segredos da natureza, o faz com reverência, reconhecendo que seu papel é o de descobrir e compreender, e não o de substituir a própria inteligência divina.
Frankenstein e Pigmalião nos ensinam, portanto, duas lições fundamentais sobre o limite da ciência. De um lado, a falsa ciência, autossuficiente e arrogante, acaba por se perder em um ciclo infinito de criação e destruição, tornando-se incapaz de estabelecer qualquer relação autêntica com sua criação, um ciclo que reflete a revolta do ser contra um criador que não sabe amá-lo. Do outro, a ciência verdadeira, quando se submete à ordem sobrenatural e reconhece que a vida é um dom a ser contemplado e não manipulado, cria harmonia, tal como Pigmalião e sua amada Galateia.
A ciência, portanto, só pode ser verdadeiramente benévola quando subordinada ao poder sobrenatural, ao reconhecimento de que não somos os únicos senhores da criação. A vida é mistério, é dom, é graça. Ao homem cabe a contemplação, a reverência e o aprendizado. Qualquer tentativa de apropriação indevida da vida sem o devido reconhecimento de sua origem divina está fadada a criar monstros, frutos da soberba e da insensatez. E assim, entre Frankenstein e Pigmalião, resta ao homem escolher: buscar a glória vã da criação autônoma ou render-se, humildemente, ao Criador, e contemplar a beleza da verdadeira vida.
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