top of page
Foto do escritorDr. Eduardo Fidelis

O Respeito ao Corpo

O respeito ao corpo transcende a simples aparência física, ultrapassa a vaidade que insiste em se fixar na superficialidade dos sentidos e adentra as profundezas da dignidade humana. O corpo, como templo do Espírito, carrega consigo a marca da sacralidade, uma marca que nos chama a viver de maneira ordenada, em comunhão com aquilo que é transcendente e verdadeiro. E, nesse sentido, a virtude da castidade se torna uma expressão luminosa desse respeito, sendo um modo de vida que busca a harmonia entre a razão, a fé e o desejo natural que habita cada ser humano.


A castidade, muitas vezes confundida com uma mera abstenção, é, na verdade, um processo de integração, uma disposição ativa e constante de submeter a sexualidade ao domínio da razão e da fé. Não se trata de repressão ou de negação dos impulsos naturais, mas de um ordenamento que visa a plenitude do ser humano em sua relação consigo mesmo, com o outro e com Deus. Assim, a castidade é um ato de respeito à própria dignidade e à dignidade dos outros, pois se recusa a transformar a sexualidade em uma ferramenta de egoísmo, de uso ou de objetificação.


Em contrapartida, a chamada "revolução sexual" propôs um caminho que pretendia libertar o homem de amarras e convenções, mas que, na prática, muitas vezes o subjugou a outras formas de opressão, mais sutis e menos visíveis. A promessa de liberdade por meio da sexualidade desvinculada de compromisso e transcendência acabou por reduzir o corpo a um mero objeto de prazer imediato, negando sua dimensão espiritual e a beleza de sua vocação ao amor verdadeiro. Como disse São Paulo aos coríntios, "Tudo me é permitido, mas nem tudo convém. Tudo me é permitido, mas não deixarei que nada me domine" (1 Cor 6,12). A verdadeira liberdade não está em fazer o que se deseja, mas em desejar aquilo que é bom, em ordenar os impulsos de modo que estes sirvam ao bem maior da pessoa.


O autocontrole, nesse contexto, é uma virtude que transcende a esfera da sexualidade e se aplica às diversas paixões e desejos humanos. O homem que domina seus desejos é aquele que verdadeiramente é livre, pois não se deixa escravizar pelos impulsos desordenados que tentam subjugar sua razão. Como ensina o livro dos Provérbios: "Como cidade derrubada, sem muralhas, assim é o homem que não domina suas paixões" (Prov 25,28). O autocontrole é, portanto, um ato de construção de muralhas que protegem a cidade interior do homem, resguardando-o das invasões que ameaçam sua dignidade e seu chamado à grandeza.


A "revolução sexual", ao negar a importância dessas muralhas, resultou em uma visão fragmentada do corpo, que passou a ser visto como algo separado da pessoa, como se não houvesse uma unidade entre o ser e a corporeidade. O corpo deixou de ser reconhecido como expressão de uma vida interior e passou a ser tratado como um objeto a ser explorado, uma mercadoria a ser consumida. Roger Scruton, em sua obra "Beleza", explora essa ideia ao falar da "pessoa corporificada", afirmando que o reconhecimento da beleza do corpo humano está ligado ao reconhecimento da subjetividade que nele se manifesta. Quando olhamos para o corpo de outro ser humano, não estamos apenas vendo uma forma física, mas contemplando a expressão de uma vida, de uma dignidade, de um mistério que nos escapa, mas que nos chama ao respeito e à reverência.


A castidade, portanto, é também uma forma de contemplar a beleza humana, pois nos ensina a ver no corpo não apenas uma fonte de prazer, mas a expressão de uma pessoa inteira, com sua dignidade, sua subjetividade e seu mistério. Ela é um convite à vivência do amor verdadeiro, aquele amor que não busca o próprio interesse, mas que se doa pelo bem do outro, respeitando seus tempos, seus limites e seu valor inestimável. Esse amor é o oposto da objetificação promovida pela revolução sexual, que reduz o outro a um instrumento de satisfação pessoal, desconsiderando sua natureza integral e sua vocação ao infinito.


A castidade, então, não é um freio à liberdade, mas uma condição para que a liberdade seja plena e verdadeira. Assim como um atleta disciplina seu corpo para conquistar a vitória (1 Cor 9,25-27), o homem casto disciplina seus desejos para conquistar a plenitude do amor, um amor que não se deixa levar pelo imediatismo, mas que busca aquilo que é eterno e perene. O corpo, respeitado em sua dimensão espiritual, torna-se um sacrário do amor, um templo onde habita o Espírito Santo (1 Cor 6,19-20). E é nessa morada que o ser humano encontra a paz, a verdadeira felicidade, pois vive em harmonia com a ordem natural e com o propósito último da criação.


Diferentemente do que pregou a "revolução sexual", a sexualidade não é um fim em si mesma, mas parte de um todo que visa a comunhão, o amor e a vida. Quando se separa a sexualidade de seu contexto de compromisso e entrega, corre-se o risco de desumanizar a própria experiência sexual, reduzindo-a a algo instintivo e passageiro, desprovido de significado e profundidade. A castidade é um lembrete de que o ser humano é mais do que suas paixões, que ele é chamado a um amor que transcende o simples prazer e que se realiza na doação de si, na construção de relações que sejam verdadeiras, duradouras e fecundas.


Por fim, o respeito ao corpo não é uma imposição externa, mas uma exigência interna da própria dignidade humana. É um caminho de realização e de plenitude, um caminho que nos chama a viver em conformidade com nossa natureza e com o chamado que nos foi feito a sermos santos e irrepreensíveis diante de Deus (1 Ts 4,3-5). A castidade e o autocontrole são virtudes que elevam o ser humano, que o libertam da escravidão dos desejos desordenados e que o conduzem à verdadeira liberdade, aquela que é encontrada no amor que se doa, que respeita e que busca o bem do outro. E é nesse amor que o corpo encontra seu verdadeiro sentido, sua verdadeira beleza, tornando-se, como diz o Cântico dos Cânticos, "um selo sobre o coração", um reflexo da grandeza do Criador que nos fez para o amor e para a eternidade.

0 comentário

Posts Relacionados

Ver tudo

Comments


bottom of page